Comendo pelas beiradas desde o lançamento do primeiro single, “AMOR HARDCORE”, o quinto álbum de estúdio de MOE, chega ao mercado como uma mudança de rumo interessante dentro da carreira de sua artista criadora, conhecida por sua extensa imersão na música eletrônica e agora partindo para uma veia mais experimental que mistura gêneros latinos e alternativos. Essa mudança se torna explícita e percebida já em “TITANE”, faixa número 1 do disco, que retrata o posicionamento da cantora frente a críticas passadas que recebeu em sua vida e as retribuiu não só com a mudança de gênero, mas também com mudança em seu estilo lírico, que mantém o sarcasmo de sempre, mas de forma mais confrontante desta vez. “LITURGIA” prossegue a tracklist; aqui, vemos MOE e um interesse romântico definindo um meio termo para viverem uma relação baseada na disposição de amar, em uma letra mais abstrata, mas que funciona pela sua universalidade nos temas sublinhados. “CASABLANCA”, colaboração com PRAYOR, traz as sensações advindas de um conflito dentro de um relacionamento; os dois compositores discutem entre si, brilhantemente, imagens surrealistas que tentem chegar perto do que realmente sentem um pelo outro dentro da crise conjugal. “TANGOS DE UNA SIRENA LLORONA” trata o empoderamento próprio de forma complexa, mas surpreendentemente bem desenvolvida, em seus versos curtos, que destacam o modo como ela transforma suas dores em motivos para sorrir e em partes de sua história enquanto mulher. “COSMOPOLITANA” traz o misticismo e o mundano de MOE em uma faixa que versa sobre suas diversas e intensas camadas enquanto pessoa, sentindo-se protegida por forças além de seu controle, mas ainda controlando o máximo de relações interpessoais que consegue, tendo aqui um potencial para sucesso nas pistas de dança. “FLAMING JUNE”, lançada como um dos singles da era, demonstra uma camada mais solitária e íntima do eu lírico, que se sente deixada de lado por um parceiro em nome da apatia por tudo e por todos, algo que ela vai adquirindo também para si mesma, como visto no outro da faixa. “KAWAII KAWASAKI” é uma das músicas mais explicitamente sexuais do álbum, ainda que não mencione o ato o tempo inteiro; MOE se utiliza de metáforas de velocidade e de luxos materiais para proporcionar ao seu interesse carnal tudo o que ambos precisam. “TURNSTILE”, lançada previamente como lead single da era, discorre sobre o processo de mudança pessoal vivido pela artista, que pode ser aplicada em seus gêneros musicais e também em sua personalidade apresentada. Menos confrontante do que em “TITANE”, ela está mais comedida, no passo da confiança, mas não totalmente lá. “BESTIALIDAD” retoma o teor sexual de “KAWAII KAWASAKI” em modo mais acelerado, e é divertido o modo como MOE seduz seu ouvinte e o instiga a ser tão profano quanto ela. Em “MUCHO ME DUELE”, a cantora aborda uma vulnerabilidade particular em sentir falta de uma pessoa mais velha em sua vida e de compartilhar seus novos momentos e sua nova rotina com essa pessoa, honrando o “amor” de “AMOR HARDCORE” no modo como os versos se tornam mais longos, mas não menos emocionantes. “TE DESEO BESITOS” soa como uma música de despedida incomum, que não encara a probabilidade de uma morte, mas de uma nova mudança de pele e de vida para o eu lírico, pronto para mais uma radicalização de personalidade bem-vinda a si. “EL ULTIMO CALAMBRE”, última faixa do disco, é também a mais “apoteótica”, por assim dizer. MOE se apresenta com todas as camadas destiladas nas faixas anteriores e jura resiliência nos momentos finais de uma jornada, naquela que é, sem dúvidas, a canção que mais representa a tese do álbum no modo como sua vulnerabilidade e devoção também é sua maior força. Visualmente, “AMOR HARDCORE”, com produção assinada também pela artista autora, traz o trabalho mais bem refinado da carreira de MOE, unindo o experimental ao padrão e rejeitando estruturas tradicionais a fim de expressar as ideias radicalizadas por trás das letras também em seu encarte, vibrante e que em nada incomoda a visão. Ao final da experiência, o ouvinte que já conhece MOE apenas a respeita mais enquanto artista que sabe incluir suas visões criativas em seu trabalho, e o ouvinte que não for familiar com trabalhos anteriores da cantora entende o esmero que é amar demais ou de menos, porque o ato de amar em si, segundo o álbum, já é radical por natureza própria, restando apenas explorar os limites desse radical.